quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Crença verdadeira e conhecimento


Sócrates – Diz-me, então, qual a melhor definição que poderíamos dar de conhecimento, para evitar cair na contradição?
Teeteto – Precisamente o que estávamos a dizer na resposta anterior. Eu, pelo menos não consigo pensar em nada melhor.
Sócrates – O quê?
Teeteto – Que a crença verdadeira é conhecimento; ao menos a crença verdadeira é infalível e tudo o que dela resulta é nobre e bom. (…)
Sócrates – A questão não exige um exame prolongado, pois há uma profissão que mostra que o conhecimento não é o que estás a dizer que é.
Teeteto – Com assim? Que profissão é essa?
Sócrates – A desses grandes exemplos de sabedoria, que são os oradores e advogados. Tais indivíduos, utilizam a sua arte para produzir convicção nos outros sem os ensinarem, fazendo as pessoas acreditar no que eles querem que acreditem. Ou julgas tu que há mestres tão habilidosos que, no breve tempo que a clepsidra lhe permite, sejam capazes de ensinar devidamente a verdade aos ouvintes sobre um roubo ou outro crime qualquer de que não há testemunhas?
Teeteto – De modo algum acredito nisso. Creio que eles se limitam a persuadir os ouvintes.
Sócrates – Estás então a dizer que persuadir alguém é levá-lo a acreditar em algo?
Teeteto – Sem dúvida.
Sócrates – Então, quando os juízes são justamente persuadidos de algo que só uma testemunha ocular, e mais ninguém, pode saber, não é verdade que, ao julgarem esses assuntos por ouvir dizer e ao formarem uma crença verdadeira, tomaram a sua decisão sem saber se deram uma sentença correcta, ainda que tenham sido persuadidos da verdade?
Teeteto – Com certeza.
Sócrates – Mas, meu amigo, se a crença verdadeira e o conhecimento fossem a mesma coisa, nem sequer o juiz mais competente teria uma crença verdadeira sem conhecimento. A verdade, porém, é que se trata de duas coisas distintas.
Teeteto – Lembro-me agora que eu já tinha ouvido alguém falar dessa distinção: que a crença verdadeira acompanhada de justificação é conhecimento e que desprovida de justificação, ela está fora do conhecimento. (…)
Sócrates – Ora bem, quando alguém possui uma crença verdadeira sobre alguma coisa sem justificação, pensa verdade acerca disso, mas não a conhece. Portanto, aquele que não for capaz de dar e de receber uma justificação sobre algo, ignora-o. Mas quando tem uma justificação, não só tudo é possível, como está completamente na posse do conhecimento. (…)
Teeteto – Precisamente.
Sócrates – Teeteto, será que acabámos de descobrir aquilo que há muito os sábios procuram sem encontrar?
Teeteto – Assim me parece, Sócrates. O que acabámos de dizer parece-me acertado.
Sócrates – É possível que sim, pois que o conhecimento poderia haver sem justificação e sem crença verdadeira. (…)
Platão, Teeteto, pp. 200d-202d
1. Tendo presente o exemplo da profissão fornecido por Sócrates (oradores e advogados), torne evidente o motivo pelo qual se podem encontrar diferenças entre conhecimento e crença verdadeira.

(Retirado do site netprof)

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